Arquitetura sustentável
Projeto na Serra Catarinense é construído com baixo impacto no ambiente
Ecovillage: o desafio de encontrar os produtos e serviços amigáveis com a natureza para viver bem
Sustentabilidade é um tema recorrente em diversos setores, inclusive na elaboração dos conceitos de habitação. Mas entre debater sobre o assunto e realizar algo realmente sustentável há uma distância. Executar uma obra com esse valor exige comprometimento e pesquisa, desde a escolha do terreno até as práticas que os moradores irão manter em suas rotinas.
O modo de viver durante a pandemia trouxe muitos aprendizados para quem se dedica à arte de morar bem, adaptar-se e viver em casa de forma mais intensa. O desejo dessa família de ter um refúgio na Serra Catarinense ficou latente durante a pandemia, quando estiveram em diferentes casas alugadas com amigos e familiares mas que, apesar da experiência renovadora de estar perto da natureza, não encontravam o conforto e a funcionalidade que desejavam em uma casa de campo.
Conta a proprietária Anna Carolina Fernandes que encontrar o terreno ideal levou poucos meses e foi mais fácil do que estruturar o projeto sustentável que tanto ansiavam para essa casa na serra, afinal, os requisitos eram ambiciosos: arquitetura sustentável, celeridade na obra e custos adequados. “O primeiro projeto arquitetônico considerou uma casa container, mas literalmente naufragou com a falência da empresa contratada para executá-lo. De saldo desta primeira tentativa, ficaram a estrutura da laje pronta e um módulo que foi reaproveitado para a guest house”, lembra.
Steel frame: a tecnologia construtiva escolhida
O desafio de construir com uma nova tecnologia sustentável, longe do centro urbano, e refazer todo o projeto arquitetônico não desanimou a família. Depois de muita pesquisa e busca, escolheram utilizar a tecnologia construtiva do steel frame e contrataram a arquiteta Gabriela Stefanelli, profissional que os acompanha há anos, para desenvolver um novo projeto, reaproveitando, claro, a estrutura da laje que já estava pronta no terreno.
Os pilares da construção sustentável nortearam praticamente todas as decisões da construção desse refúgio, desde a escolha do terreno até os acabamentos. Veja os requisitos escolhidos:
Posição solar mais adequada para a construção. No caso, todas as aberturas principais para o norte;
Enfoque em privilegiar a iluminação e ventilação naturais e cruzadas;
Uso de cisterna e biodigestor na instalação hidrossanitária;
Escolha do sistema de construção por steel frame, que implica em uma obra seca (1% do uso de água em comparação com outros métodos), menor desperdício e descarte de materiais, e com as vantagens do isolamento térmico, ideal para o clima da serra catarinense.
“Como responsável por gerir o projeto, posso afirmar que passei esses dois anos estudando muito sobre o assunto, pesquisando e descobrindo materiais, fornecedores e, principalmente, entendendo como aplicar os princípios da sustentabilidade nesta casa”, conta Anna Carolina.
Legado para as próximas gerações
Anna Carolina, com a gestão da obra baseada em critérios bem definidos, espera influenciar as pessoas a fazerem construções mais gentis com a natureza. “Até mesmo conhecer a mostra permanente da Healthy Building Certificate em São Paulo eu fui, para aprender in loco”, relata.
“Não é fácil, às vezes o custo é até maior, mas fico feliz com o resultado e espero influenciar e inspirar outras pessoas a fazerem o mesmo, para que as próximas gerações possam se beneficiar desse cuidado com o ecossistema, que inclui não só o meio ambiente, mas os processos de fabricação e as pessoas”, diz a proprietária.
O projeto foi feito a seis mãos, pois contou também com a arquiteta Andressa Danguí Schmickler, especialista em construção a seco, e que integrou a equipe na parte de gestão técnica da obra, que envolveu muita pesquisa e troca de conhecimento nesse pequeno grupo de mulheres comprometidas com a sustentabilidade.
Detalhes do projeto arquitetônico da casa principal
A casa principal teve como foco a vista espetacular do terreno, escolhido a dedo por conta dela e porque permitia a construção com a posição solar ideal para a região, a norte. Esse foi o ponto de partida para posicionar e desenvolver o layout da casa.
Com o uso esporádico em fins de semana, o casal e sua filha queriam uma casa funcional e sem exageros, por isso o layout contemplou, além da cozinha e área social, apenas uma suíte, o quarto infantil e um escritório para o trabalho remoto, todos com aberturas para as melhores vistas do terreno.
Desenho arquitetônico
Inspirada nas lake houses contemporâneas, a proprietária pediu linhas retas, uso de pedra e madeira no desenho arquitetônico, diferente dos tradicionais chalés de madeira ou casas de tijolinhos presentes na região.
E o resultado final agradou “Ainda que o steel frame nos apresentou desafios para as linhas retas do telhado, conseguimos chegar no desenho e resultado que eu queria, amplas aberturas de vidro, equilibradas com o conforto térmico interno, linhas contemporâneas e materiais que conversam com esse lugar, como essa fachada de pedra e os detalhes em madeira do terraço.”
Falando em terraço, a área gourmet integrou o fogão e forno a lenha com a churrasqueira, os tijolinhos de demolição utilizados no piso trouxeram conforto térmico e a rusticidade do campo, e o SPA estrategicamente posicionado brinda com espetaculares vistas do entorno e pôr do sol.
Materiais
O uso de materiais sustentáveis, ecológicos ou reciclados influenciou todas as decisões e compras para a construção da casa. Veja as escolhas para a obra:
Uso exclusivo de madeiras certificadas e de reflorestamento;
Telhas ecológicas;
Tijolos de demolição;
Iluminação exclusivamente por LEDs e solar (o casal utiliza a geração solar de outra residência também para a conta de luz da casa na serra);
Piso vinílico com certificação de reciclado e ecológico;
Metais e cerâmicas de indústrias do estado (o que resulta em menos combustível de transporte e diminui a emissão de gases de carbono);
Impermeabilizantes e tintas com certificado de sustentabilidade;
Acabamentos como portas (MDF naval), rodapés (PVC), e hidráulicos (menor consumo de água) também se adequaram aos princípios da sustentabilidade.
“Passei muitas horas na internet para descobrir esses materiais e o que de fato é considerado correto do ponto de vista da sustentabilidade. Os metais, ainda que não sejam ecológicos, atendem a requisitos como menor consumo de água (como o chuveiro e vasos sanitários diminuem em 40% o uso de água) e de serem feitos por indústrias da região. E assim, como tantos outros que elegemos em conjunto, eu e as arquitetas, para essas duas casas”, relata a proprietária.
Projetos de Interiores da casa principal
A sustentabilidade também direcionou as escolhas para o projeto de interiores, feito em parceria entre a proprietária e a arquiteta Gabi Stefanelli, e que se inspirou nas linhas orgânicas das casas escandinavas e farmhouses. Uso de madeiras certificadas nos móveis, a maioria confeccionados por marceneiros locais e por artesãos da região, e inclusive a recuperação de móveis da família como uma cômoda quase centenária, foram privilegiados na composição dos ambientes.
“Em contrapartida ao exterior mais escuro, de linhas retas e contemporâneo, queria uma casa com texturas, orgânica e com cores claras, por isso escolhemos um piso com estilo rústico de madeira bem ao estilo farmhouse, quartos com painel ou papel de parede, móveis com texturas, madeira e cor. E o resultado ficou como eu sonhei, amei a palhinha na cozinha, essa linda mesa bem ao estilo de fazenda e o aconchego dos quartos”, diz Anna Carolina.
Cozinha
O verde pontuou o estilo country moderno do desenho do mobiliário desta cozinha, que teve a pia esculpida em granito apicoado para remeter às antigas bancadas de fazenda. O uso da palhinha foi estratégico para esconder o aquecedor a gás e a máquina de lavar/secar e foi também aplicada no buffet, desenhado exclusivamente para a casa e executado pela marcenaria Hildebrando, a mesma que executou os móveis do banheiro da suíte e os da sala da Guest House.
Suíte
As mesmas linhas suaves do verde, que remete ao exterior da casa, estão na suíte. O espaço conta com um painel de aquarela feito sob medida na cabeceira, cujo destaque, além da vista, é a cômoda que pertenceu ao avô e ao pai da proprietária, e que ganhou uma restauração para integrar esse quarto. O banheiro anexo também recebeu muita claridade, com amplas aberturas, que presenteiam com a vista do pôr do sol durante o banho, especialmente na banheira de imersão feita sob medida em uma fábrica na cidade vizinha.
Quarto infantil
Uma mãe artista presenteou Helena, filha do casal, com um lindo painel pintado à mão e inspirado nos desenhos escandinavos de montanhas e animais. Com uma casinha na árvore no terreno e muito espaço externo, o pequeno quarto buscou ser aconchegante e também privilegiar a vista, tendo um deck de madeira com acesso direto ao quintal, para facilitar as brincadeiras ao ar livre.
Escritório
O escritório, que também atende aos hóspedes, foi o último item a ser agregado ao projeto arquitetônico. Sua vista contempla o sol da manhã, e aqui buscou-se poucos elementos para não atrapalhar o “fundo de tela” e a melhor iluminação para a bancada.
Guest house
Para complementar este projeto enxuto, a guest house feita com a tecnologia das casas modulares, foi também estrategicamente posicionada no terreno, conferindo privacidade e vistas ainda mais belas aos convidados do casal no fim de semana. “Adoramos receber em nossas casas, mas os espaços dos hóspedes sempre ficam longe da área íntima, pois acredito que para receber bem é importante conforto e privacidade. Por isso, desde o início planejamos essa guest house, que acomoda um casal e filhos com espaço e muita comodidade”, diz Anna Carolina Fernandes.
A Guest House, cuja estrutura externa foi reaproveitada do primeiro projeto da casa, foi inspirada nas tiny houses. A execução desse projeto ficou ao encargo da Danguí Construções Modulares, parceira dos proprietários também na gestão da obra da casa principal. Os projetos arquitetônico e de interiores do módulo ficaram a cargo da arquiteta Gabi Stefanelli.
A estrutura de metal, preenchido com placas de EPS, recebeu isolamento térmico de lã de PET e acabamento de gesso interno e seus 33m2 foram muito bem aproveitados, criando um quarto de casal, uma sala com lareira, mesa de trabalho ou refeições e bancada de apoio, e um banheiro espaçoso onde a banheira de imersão também está estrategicamente posicionada para o belíssimo pôr do sol da região.
Interiores
O projeto de interiores da guest house se inspirou nas tiny houses com um ótimo aproveitamento dos espaços, criando um ambiente fluido e integrado. Aqui o decor trouxe os elementos das casas escandinavas, nos móveis, uso de madeira teka, nos elementos orgânicos e nas tramas e cores. O enxuto quarto de hóspedes ganhou cor com o verde (Suvinil) e móveis da tokstok em madeira certificada, a sala com sofá cama e lareira tem a vista da serra e está integrada com uma ampla bancada de teka, requisito da proprietária para seu trabalho com cerâmica, e uma mesa para refeições ou trabalho. Os móveis do espaço, também desenhados pela Gabi Stefanelli, aproveitaram cada centímetro do espaço e também usaram o recurso da palhinha para esconder o aquecedor a gás.
Paisagismo
O investimento no paisagismo começou assim que o terreno foi adquirido. Uma ampla pesquisa e busca por espécies nativas da mata atlântica da região resultou no plantio de mais de 400 mudas de árvores de 20 diferentes espécies, na esperança de reflorestar uma parte do terreno de quase 6 mil m2. Em complemento, foi criado um bosque de Araucárias e dois pomares de mudas enxertadas, um de cítricos e outro de frutas diversas, somando um total de 500 árvores novas no terreno.
As árvores antigas passaram também por uma recuperação, com poda, limpeza de parasitas e adubação, e uma delas ganhou a casinha de brinquedo da filha do casal, também construída em madeira certificada e de reflorestamento.
A opção por um amplo gramado, que unisse as casas e o fogo de chão, foi determinante para evitar as roçadas constantes que o terreno exigia. Uma área para a horta ecológica foi criada, com espécies de diferentes temperos, ervas para chás e plantas mais perenes como a couve e os tomatinhos cereja.
Para completar o belo cenário, mudas de hortênsias, grinalda de noiva, agapantos e lavandas, essas últimas estrategicamente posicionadas para afastar as aranhas da casa, foram plantas ao redor das casas e do pequeno lago bebedouro, incluído apenas para atrair pássaros e pequenos animais da região.
A iluminação solar foi bem aproveitada no jardim, assim como focos bem posicionados com sensores de luz, para valorizar as antigas árvores do terreno.
Dicas de Sustentabilidade
Com todo o aprendizado que veio do objetivo da prática sustentável, a proprietária da casa e as arquitetas elencam algumas dicas importantes para este tipo de processo, com o desejo de influenciar outras pessoas a seguirem este modelo que agride o menos possível os ambientes. Veja as dicas:
Busque fornecedores e fábricas locais: como o frete no Brasil é feito majoritariamente por transporte rodoviário, ao escolher fornecedores e fábricas locais e próximos você evita uma maior emissão de gases de carbono, além de estimular a economia local. Se puder ser um pequeno empreendedor e artesão, melhor ainda, cuidando para que atenda as questões do fair trade.
O uso de chuveiros ecológicos, vasos sanitários com válvula dupla e cisterna tem um impacto grande no consumo e reaproveitamento de água.
Mesmo o terreno sendo em um condomínio fechado, não havia a opção de um sistema de tratamento de esgoto. Quando a única saída for um sistema com fossa, inclua o biodigestor no final do processo. Toda a água utilizada passa por ele no final e é reaproveitada em canaletas de infiltração na área do pomar.
Sempre exija que as madeiras, de móveis e na construção, sejam de reflorestamento e certificadas. O status ou a beleza de outras não pode prevalecer sobre o desmatamento de florestas.
O piso vinílico tem uma aplicação rápida, limpa, durabilidade excelente, além de entregar o que mais queríamos: beleza e conforto térmico. Foi inclusive utilizado na cozinha, dando unidade ao espaço social. Mas certifique-se de que é feito de materiais reciclados e atende aos requisitos da sustentabilidade.
Na área externa tínhamos um grande dilema sobre o piso, pois cimento queimado ou porcelanato eram inadequados para o frio da serra. Os tijolinhos de demolição, que passaram por uma limpeza e impermeabilização, foram a solução ideal, tanto esteticamente como na questão de conforto. Acabamos utilizando também nos demais caminhos externos da casa, de forma prática e fácil.
As amplas aberturas foram posicionadas estrategicamente para iluminar e ventilar a casa. Todas receberam telas e assim, podemos mantê-las abertas dia e noite e não tivemos necessidade de utilizar a instalação de ar condicionado, porém a infraestrutura para aparelhos ficou pronta na casa.
No paisagismo, privilegie mudas e plantas da região, que atraem as espécies e já estão adaptadas ao clima. A exceção que fizemos foi a Lavanda, para substituir a necessidade de dedetização, pois ela afasta aranhas e escorpiões. Também criamos um sistema de gotejamento na horta com a água que é recolhida da chuva, em nossa cisterna.
O uso de isolamento térmico, com fibra de pet, faz com que a casa tenha temperaturas adequadas durante qualquer estação e reduz significativamente o uso de aquecedores e ar condicionado.
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Em resumo, na casa foram utilizados:
Métodos construtivos sustentáveis como o steel frame e a casa modular;
Consumo eficiente de água: Chuveiro e vasos com menor consumo, uso de cisterna para captação de água de chuva e biodigestor onde 100% da água usada é reaproveitada para irrigação do pomar;
Economia de luz: Nosso sistema de geração de energia solar também é usado para casa na Serra, onde além de privilegiar a iluminação e ventilação naturais, usamos exclusivamente iluminação por LED e Solar (água com aquecimento a gás);
Todas as madeiras foram de reflorestamento e certificadas, inclusive nos móveis;
Recuperação da mata nativa com plantio de mais de 400 mudas;
Acabamentos, tintas, e outros produtos com princípios ou certificações de sustentabilidade, com foco na arquitetura sustentável.
Ficha técnica projeto Ecovillage
Projeto arquitetônico, luminotécnico e interiores da casa principal e do módulo para Guest House: Arquiteta Gabi Stefanelli – @arquitetagabistefanelli
Casa modular: Danguí Construções Modulares – @dangui.construcoes
Gestão técnica: Arquiteta Andressa Danguí Schmickler – @andressa.dangui
Coordenação geral – Anna Carolina Fernandes – @e.covillage
Materiais
Materiais de Steel Frame: Mundo Steel e Smart
Execução da Obra de Alvenaria: Work Construções @workconstruc
Piso vinílico: Linha City Sorano Durafloor
Biodigestor: Sanear
Telhas ecológicas: linha clássica Ecoline
Tintas e impermeabilizantes: Tinta ecológica Kröten, Linha Suvinil Limpeza Total (Elefante cor externa e Cromio cor interna), Imperlast Telhado impermeabilizante
Móveis planejados: Marcenaria Hildebrando @hildebrandomoveis
Móveis artesanais: Rustticos Móveis @rustticos
Painel quarto infantil: artista plástica Anna Carla Andrade @annacna
Spa e banheiras: Fibertec e Faiberplas
Porcelanatos: White Natural e White Plain Matte da Portinari
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